sábado, 3 de setembro de 2011

Todo mundo tem

Quando Chico Buarque compôs a letra da “Ciranda da Bailarina”, esqueceu-se de listar que todo mundo tem um projeto. Não importa a idade, sexo, extração social, nível cultural. Não importa nada. Todo mundo tem um projeto, reitere-se. O que é interessante é que todos os projetos – sem qualquer exceção – já nasceram sob a égide do êxito. São, todos, sinônimo de sucesso.

Toda criança tem um projeto: ser astronauta, bombeiro, médico, jogador de futebol. Um dia, num programa televisivo, perguntaram às crianças de uma escola o que elas seriam quando crescessem (aquela velha história). Cada um correspondeu à expectativa geral: médico, advogado, empresário, policial... De repente, apareceu um sardento e disse pausadamente: quero ser ginecologista. Olhou para a câmera e deu uma gargalhada.

O professor da academia queria abrir uma pizzaria. Dizia que faria um preço camarada para os alunos dele. Além disso, se pedissem acréscimo de algum ingrediente, não hesitaria em atendê-los. Com esse expediente bastante inventivo, disse que ficaria rico e abriria uma rede de pizzarias. Por certo, tinha uma legião de alunos. Não sei que fim levou o sujeito, se abriu o negócio ou não. Logo depois daquela conversa, desisti da academia. Ainda bem.

Um outro espertalhão decidiu construir um prédio cujos apartamentos seriam alugados para os estudantes que estavam matriculados na faculdade que distava três quadras do imóvel. O sucesso também era garantido. Com a pequena distância existente entre a morada e a faculdade, os alunos certamente iriam alugar os apartamentos e pagariam o preço que fosse. “A facilidade é muito grande e estudante de universidade privada tem muito dinheiro”, era o que dizia o gênio. Depois de algum tempo, perguntei a ele como estava o andamento das obras e fiquei sabendo que não havia terreno disponível naquelas imediações. O jeito seria procurar por outra localidade. Até hoje ele não a encontrou. Somente por essa razão, não ficou milionário.

Tem outra: dois gordinhos sedentários foram participar de uma corrida com trajeto de 3 ou 4 quilômetros. O mais obeso logo avisou: “O negócio é ir devagar no começo. Depois de algum tempo, todos estarão cansados e nós estaremos na boa. Aí, é só avançar, passar por todo mundo e ganhar a corrida”. Quinhentos metros após a largada, o gordinho papudo, já esbaforido, resolveu cortar caminho. A fiscalização do evento o desclassificou imediatamente. O outro gordinho, em solidariedade ao amigo, desistiu da empreitada. Mas não deixou por menos: “Pô, sem você não tem graça. A gente combinou de ganhar junto”. Por certo, o projeto era coletivo.


O balconista também tinha um projeto. Ele não gostava de estudar e jamais pensou em fazer graduação. Faria o supletivo e tudo bem. Dizia que, mesmo assim, venceria na vida, largaria o bar do tio e teria uma vida tranquila, sem depender de salário de ninguém. Tinha facilidade para línguas. Convicto, disse que estudaria alemão e inglês e que isso seria suficiente para ser contratado por uma multinacional. Com empenho (esse pelo menos sabia que teria de ralar um pouco), em 2 anos, no máximo, teria um cargo de gerente. Dali para ser sócio, seria um passo. “Vá em frente, meu caro”, foi a única coisa que consegui falar para ele. Eu estava bêbado e não adiantaria estender a conversa. Dei uma força para o camarada. Depois de muitos anos, liguei num departamento da prefeitura municipal e ele atendeu. Está lá até hoje e, ao que tudo indica, é bem versado nos vernáculos germânico e anglo-saxão.

Segundo um velho amigo, os entrevistados do Jô na Globo também têm um projeto. Se forem artistas, então.... Haverá sempre uma novela, um filme a ser feito ou dirigido, uma temporada no teatro ou uma turnê musical. Em suma, ninguém escapa de ter um projeto.

Se eu tenho um? Não. Tenho um desejo: viver de renda. Só não sei como fazer isso. Se alguém souber, por favor, me avise.

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