Segunda opção - Roberto Barbato Jr
Meu corpo já putrefaz. Bebi,
fumei, experimentei ervas e essências. Um sedentário incomparável. Nunca segui
uma prescrição médica. Por décadas, dormi mal e pouco. Materialmente também sou
uma catástrofe. Gastei tudo o que ganhei, sem pudor. Não acumulei, não
projetei, não previ. Vivia a oportunidade do momento. Pagava o almoço, o
aluguel e as putas. O que entrava, saía.
O futuro ainda não existia.
Agora, estou convicto de que
já vivi mais da metade da minha vida. Daqui para frente, o caminho será pesaroso.
Sujeitar alguém a viver é o pior castigo. Muito pior que a morte. Não é isso
que dizem?
Não terei mulher. Meus
filhos não saberão onde estarei. A dona da pensão a que serei relegado, depois
de alguma paciência, vai me despejar por motivos óbvios: meus serviços não lhe
serão mais úteis. Sem alternativa, desembocarei
num abrigo municipal, ávido por uma sopa e um cobertor capaz de me ensejar alergia.
Serei alocado em um cômodo fétido, recendendo a urina. Minha cervical, quase pó
de osso, não me permitirá dormir. Anti-inflamatórios me serão negados, sob a
desculpa de que a verba para remédios foi há muito cortada pelos gestores da coisa
pública (justo pra mim que, um dia, acreditei no Estado). Quando chegar o
verão, a coluna de certo vai melhorar, mas os pernilongos e as baratas farão a
festa. Malditos.
Eu sei, eu sei. Esse cenário
é quase idílico diante das doenças que estarão em curso. Males, síndromes
degenerativas e infecções de toda sorte. Dor de verdade, sem nenhuma droga para
aplacar. Com a superveniência de uma isquemia, metade do meu corpo ficará
paralisado e eu sucumbirei na cama. Ficarei todo cagado, mijado, esperando que
alguém me limpe. Será insuportável.
Só, então, vou me arrepender de não ter agarrado a
primeira opção. Seguirei desgraçadamente acordado. E vivo.
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