Já que evoquei José Guilherme Merquior no post passado, vale a transcrição de um pequeno trecho em que ele comenta a obra Carnavais, Malandros e Heróis, de Roberto da Matta. A crítica foi publicada no Jornal do Brasil em 01/09/1979.
Quem quiser mais informações sobre Merquior poderá acessar o link: "Dez anos sem José Guilherme Merquior". Foi de lá que retirei a citação abaixo:
"Um dos méritos de Roberto da Matta é, aliás, o seu cuidado com a literatura anterior. Nada noto nele dessa pífia presunção, feita de incultura e insegurança, com que vários dos nossos mais novos praticantes de ciências humanas dão as costas ao que se escreveu antes deles - com muita freqüência, muito melhor - sobre seus temas. Em compensação, a linguagem de Carnavais, Malandros e Heróis poderia ser mais apurada. O autor expõe, em geral com clareza, não raro com certa elegância; mas volta e meia sucumbe ao desleixo ou, pior ainda, a esse fraseado esquisito com que tantos textos universitários macaqueiam gratuitamente palavras e construções inglesas ou francesas. O desleixo abrange alguns anacolutos e várias regências incorretas, além da estranha menção a um tal "Alex" de Tocqueville (que intimidades são essas, Professor Matta? O homem se chamava Alexis). O fraseado postiço inclui, por exemplo, um emprego super-abundante do verbo "colocar" (em vez de "observar", "pretender", "argumentar", "postular", etc.). Esse abuso de "colocar" está virando uma verdadeira muleta verbal do nosso jargão universitário. Mas quanto a Roberto da Matta, não tenho dúvida em (agora, sim) colocar esse seu livro bem acima dessas mazelas de expressão. Ele, pelo menos (ao contrário da maioria dos colocadores), tem muito a dizer".
"Modelando o artista ao seu feitio/ O tempo, com seu lápis impreciso/ Põe-lhe rugas ao redor da boca/ Como contrapesos de um sorriso. "Tempo e artista" - Chico Buarque/1993
quarta-feira, 30 de junho de 2010
sábado, 26 de junho de 2010
Debates nos anos noventa
Já cheguei a comentar por aqui a efervescência cultural e ideológica que havia na década de 1990. Foi nesse ano que ingressei no curso de Ciências Sociais e passei a acompanhar alguns debates travados no suplemento Letras, da Folha de S. Paulo. Tratava-se de um suplemento que existiu até 1992, quando veio a lume a primeira edição do caderno Mais!, hoje já extinto. Em Letras, os debates em torno de questões políticas eram agudos, provocativos. Talvez Mais! também tenha nascido para dar guarida a discussões acadêmicas. Todavia, não foi capaz de acolher tantas brigas fecundas. Limitou-se, após algum tempo, a mostrar tendências culturais modernas e a versar sobre temas que nem sempre me interessavam.
Em 1990, em Letras, um debate duradouro foi travado pelo saudoso José Guilherme Merquior e um doutorando de Filosofia da USP, Ricardo Musse, hoje docente daquela universidade. Já nem lembro mais qual era o teor da contenda, mas recordo-me de que ela partiu de uma resenha feita por Musse a uma determinada obra de Merquior. Além das questões teóricas propostas, houve ataques de ordem pessoal, que buscavam desqualificar argumentos em razão das atividades intelectuais de seus interlocutores.
Procurando pela rede algo sobre o debate, achei o seguinte trecho de autoria de Merquior:
"O resenhador de minha antologia [...] é apresentado como um jovem 'doutorando em filosofia na USP'. Não sei se aos doutorandos em 'filô' da USP se exige saber ler antes de pretender julgar. Em caso positivo, temo pelo doutoramento de Musse, porque as liberdades que tomou com o texto alheio não são de molde a inspirar confiança". (MERQUIOR, José Guilherme. "Resenhador de 'Crítica' foi apressado e redutor". In: Letras, Folha de S. Paulo. 17/11/1990, p. 6.)
Um trecho da réplica de Musse dizia o seguinte:
"Sem sequer me conhecer, a partir de uma só frase que me apresenta como estudante da USP, ele traça considerações genéricas sobre as minhas atividades escolares, o meu futuro acadêmico, a uni¬versidade, a imprensa, a situação da cultura no Brasil etc. Ao ver a folha de uma árvore, o nosso em¬baixador na Unesco apronta seus canhões e abre fogo — contra a floresta inteira. Foi essa facilidade metodológica que critiquei". (MUSSE, Ricardo. "Merquior vê a folha da árvore e atira na floresta". In: Letras,Folha de S. Paulo. 1º/12/1990, p. 6.).
A polêmica foi longe e acabou envolvendo, também, o jornalista Bernardo Carvalho que entrou na história em razão da transcrição de uma entrevista com Merquior.
Pouco tempo depois, José Guilherme morrera de modo precoce (1991). Quando isso aconteceu, aqueles que militavam nas tendências liberais muito lamentaram pela ausência do intelectual que era o retrato da erudição da direita brasileira. Os esquerdistas talvez tenham ficado satisfeitos por não terem mais um interlocutor de tamanha capacidade: seria mais fácil lidar com alguém que não tivesse o arcabouço teórico do grande diplomata.
Ainda no início dos anos 1990, houve um curto debate entre Antonio Candido e Miguel Reale. Segundo me recordo, no Jornal da USP, Antonio Candido teria dito que a violência é um instrumento de transformação da história. Por certo, sua ponderação estava diretamente ligada à famosa frase de Marx no capítulo "A assim chamada acumulação primitiva", d' O capital. A afirmação de Marx é simples: "A violência é a parteira da história".
Pois foi a partir do resgate de Marx por Candido que Reale publicou sua réplica, talvez na Folha de S. Paulo. A discussão era mais discreta, calcada em idéias e não em agressões sobre a personalidade acadêmica de quem quer que fosse. Creio que Antonio Candido fora incapaz de fazer qualquer comentário pessoal sobre seu interlocutor. Não deve ter trazido à baila o passado integralista de Reale e tampouco seu apoio ao Golpe de 1964. Reale, que teria iniciado o debate, silenciou quando Candido publicou um curto artigo na seção Tendências & Debates da Folha de S. Paulo. O título era algo como "pingos nos is". Morreu aí outra polêmica....
Muito tempo depois, já em 1997, acompanhei uma pequena discussão entre Maria Silvia de Carvalho Franco e Boris Fausto. Era um debate bobo, quase insosso, sobre "o que é um clássico". Homens livres na ordem escravocrata, de Maria Silvia, foi classificado com um clássico por Boris Fausto (seria isso mesmo?). Seguiu-se então uma discussão meio melindrosa....
Esses e outros debates eram extremamente úteis para quem iniciava a carreira, pois ofereciam referenciais nos quais os inexperientes e ainda sem leituras consistentes poderiam se apoiar. Circunscritos a um inequívoco maniqueísmo, tínhamos fome de debates. Não sei se aprendemos com eles.
Em 1990, em Letras, um debate duradouro foi travado pelo saudoso José Guilherme Merquior e um doutorando de Filosofia da USP, Ricardo Musse, hoje docente daquela universidade. Já nem lembro mais qual era o teor da contenda, mas recordo-me de que ela partiu de uma resenha feita por Musse a uma determinada obra de Merquior. Além das questões teóricas propostas, houve ataques de ordem pessoal, que buscavam desqualificar argumentos em razão das atividades intelectuais de seus interlocutores.
Procurando pela rede algo sobre o debate, achei o seguinte trecho de autoria de Merquior:
"O resenhador de minha antologia [...] é apresentado como um jovem 'doutorando em filosofia na USP'. Não sei se aos doutorandos em 'filô' da USP se exige saber ler antes de pretender julgar. Em caso positivo, temo pelo doutoramento de Musse, porque as liberdades que tomou com o texto alheio não são de molde a inspirar confiança". (MERQUIOR, José Guilherme. "Resenhador de 'Crítica' foi apressado e redutor". In: Letras, Folha de S. Paulo. 17/11/1990, p. 6.)
Um trecho da réplica de Musse dizia o seguinte:
"Sem sequer me conhecer, a partir de uma só frase que me apresenta como estudante da USP, ele traça considerações genéricas sobre as minhas atividades escolares, o meu futuro acadêmico, a uni¬versidade, a imprensa, a situação da cultura no Brasil etc. Ao ver a folha de uma árvore, o nosso em¬baixador na Unesco apronta seus canhões e abre fogo — contra a floresta inteira. Foi essa facilidade metodológica que critiquei". (MUSSE, Ricardo. "Merquior vê a folha da árvore e atira na floresta". In: Letras,Folha de S. Paulo. 1º/12/1990, p. 6.).
A polêmica foi longe e acabou envolvendo, também, o jornalista Bernardo Carvalho que entrou na história em razão da transcrição de uma entrevista com Merquior.
Pouco tempo depois, José Guilherme morrera de modo precoce (1991). Quando isso aconteceu, aqueles que militavam nas tendências liberais muito lamentaram pela ausência do intelectual que era o retrato da erudição da direita brasileira. Os esquerdistas talvez tenham ficado satisfeitos por não terem mais um interlocutor de tamanha capacidade: seria mais fácil lidar com alguém que não tivesse o arcabouço teórico do grande diplomata.
Ainda no início dos anos 1990, houve um curto debate entre Antonio Candido e Miguel Reale. Segundo me recordo, no Jornal da USP, Antonio Candido teria dito que a violência é um instrumento de transformação da história. Por certo, sua ponderação estava diretamente ligada à famosa frase de Marx no capítulo "A assim chamada acumulação primitiva", d' O capital. A afirmação de Marx é simples: "A violência é a parteira da história".
Pois foi a partir do resgate de Marx por Candido que Reale publicou sua réplica, talvez na Folha de S. Paulo. A discussão era mais discreta, calcada em idéias e não em agressões sobre a personalidade acadêmica de quem quer que fosse. Creio que Antonio Candido fora incapaz de fazer qualquer comentário pessoal sobre seu interlocutor. Não deve ter trazido à baila o passado integralista de Reale e tampouco seu apoio ao Golpe de 1964. Reale, que teria iniciado o debate, silenciou quando Candido publicou um curto artigo na seção Tendências & Debates da Folha de S. Paulo. O título era algo como "pingos nos is". Morreu aí outra polêmica....
Muito tempo depois, já em 1997, acompanhei uma pequena discussão entre Maria Silvia de Carvalho Franco e Boris Fausto. Era um debate bobo, quase insosso, sobre "o que é um clássico". Homens livres na ordem escravocrata, de Maria Silvia, foi classificado com um clássico por Boris Fausto (seria isso mesmo?). Seguiu-se então uma discussão meio melindrosa....
Esses e outros debates eram extremamente úteis para quem iniciava a carreira, pois ofereciam referenciais nos quais os inexperientes e ainda sem leituras consistentes poderiam se apoiar. Circunscritos a um inequívoco maniqueísmo, tínhamos fome de debates. Não sei se aprendemos com eles.
sexta-feira, 18 de junho de 2010
Saramago e Fernando Meirelles
Para homenagear Saramago, segue abaixo o link de um pequeno vídeo comovente. Trata-se do momento em que o grande autor manifesta sua opinião sobre a adaptação de seu Ensaio sobre a cegueira, feita por Fernando Meirelles.
Não deixem de ver!
http://www.youtube.com/watch?v=Y1hzDzAvJOY
Não deixem de ver!
http://www.youtube.com/watch?v=Y1hzDzAvJOY
domingo, 13 de junho de 2010
Blogagem coletiva: livro brasileiro
Em dezembro passado, William Lial – um craque da nossa literatura – promoveu em seu blog uma "blogagem coletiva". A idéia era simples: os convidados deveriam escrever sobre o melhor livro que leram no ano passado.
Pensei em dar continuidade à idéia do Lial (nem pedi autorização a ele!). Contudo, o mote da blogagem coletiva que proponho é "o último livro brasileiro que li". Quem tiver blog e gostar de escrever, poderá fazer comentários sobre o último livro que leu, desde que seu autor seja nacional. Romance, contos, poesia, ensaio, etc.... valem todos os gêneros.
A dinâmica que proponho é a seguinte: cada interessado deverá publicar em seu blog no dia 23/07 (Sexta-feira), os comentários sobre o livro escolhido. Não se trata de nenhuma resenha, nada que seja rigoroso e tampouco que contenha ares de academicismo. O objetivo é falar, de modo descompromissado, sobre o livro escolhido. É claro que, sendo possível, as informações bibliográficas da obra devem abrir a redação (autor, título, cidade de publicação, editora, ano de publicação e número de páginas).
Depois que as postagens tiverem sido feitas em seus blogs, os autores que quiserem participar da blogagem coletiva poderão me encaminhar o link correspondente. Farei a relação dos textos, autores e links aqui no Lápis Impreciso. Os participantes também podem colocar o link em seus blogs.
Imagino que possamos tomar conhecimento de obras que ainda não conhecemos. E o debate sobre elas será sempre bem-vindo!
Todos estão convidados! Manifestem-se nos comentários desse post!
Pensei em dar continuidade à idéia do Lial (nem pedi autorização a ele!). Contudo, o mote da blogagem coletiva que proponho é "o último livro brasileiro que li". Quem tiver blog e gostar de escrever, poderá fazer comentários sobre o último livro que leu, desde que seu autor seja nacional. Romance, contos, poesia, ensaio, etc.... valem todos os gêneros.
A dinâmica que proponho é a seguinte: cada interessado deverá publicar em seu blog no dia 23/07 (Sexta-feira), os comentários sobre o livro escolhido. Não se trata de nenhuma resenha, nada que seja rigoroso e tampouco que contenha ares de academicismo. O objetivo é falar, de modo descompromissado, sobre o livro escolhido. É claro que, sendo possível, as informações bibliográficas da obra devem abrir a redação (autor, título, cidade de publicação, editora, ano de publicação e número de páginas).
Depois que as postagens tiverem sido feitas em seus blogs, os autores que quiserem participar da blogagem coletiva poderão me encaminhar o link correspondente. Farei a relação dos textos, autores e links aqui no Lápis Impreciso. Os participantes também podem colocar o link em seus blogs.
Imagino que possamos tomar conhecimento de obras que ainda não conhecemos. E o debate sobre elas será sempre bem-vindo!
Todos estão convidados! Manifestem-se nos comentários desse post!
domingo, 6 de junho de 2010
Copas do Mundo
Em épocas de Copa do Mundo, lembro-me, sempre, das anteriores. Não sou tão velho, acompanhei sete Copas: 1982, 1986, 1990, 1994, 1998, 2002 e 2006.
Além delas, tenho alguma lembrança vaga da Copa de 1978. Eu tinha 6 anos e vivia brincando no pátio do prédio em que morava. Ouvia gritos de gol que, ao menos para mim, nada significavam.
Em 1982, já com dez anos, fui apresentado realmente à Copa. E da melhor maneira possível: em casa comprávamos salgadinhos e refrigerantes para ver os jogos. Ficávamos na sala, obcecados, absortos. Brasil goleava as demais seleções. A escalação daquela seleção é digna de nota: Sócrates, Zico, Junior, Falcão, Éder, Batista, Leandro, Toninho Cerezo e Valdir Peres no gol. Devo ter esquecido de alguém, mas foi a melhor seleção que vi jogar. Até hoje lembro-me de certos detalhes como, por exemplo, o último escanteio batido pelo Brasil após a fatalidade do gol de Paolo Rossi. Estavam ali minhas esperanças de não sermos eliminados.
Não acreditei na desclassificação. Acho que foi naquela Copa que aprendi a indiscutível lição de que o futebol não é justo. É preciso contar com o senso de oportunidade ou com aquilo que alguns chamam de sorte.
Em 1986, perdemos nos pênaltis para a França. Zico errou um pênalti no tempo regulamentar da partida. Disseram-me, depois, que insistiu em bater o tal pênalti porque havia prometido para o filho que, caso houvesse uma penalidade máxima, assim agiria. Foi longo o tempo em que amaldiçoei o moleque. Doutor Sócrates, então meu ídolo maior do futebol, também errou. Bateu um pênalti displicente, sem garra, sem vontade. Aquilo não combinava com ele.
1990, em plena era Collor, tivemos a pior seleção que já vi jogar. Contaminado por pruridos ideológicos, não queria ver o Brasil campeão. Achava que a eventual conquista da taça pudesse chancelar o aparente clima de prosperidade que o então presidente queria fazer vingar a todo custo. Só não gostei de termos sido eliminados pela Argentina. Maradona havia dado alguma entrevista provocativa em que vaticinara nossa eliminação. A partir de então, continuei a torcer para que perdêssemos o mundial, mas, com mais fervor, torci para que não fôssemos desclassificados pela seleção de Diego Armando. Claro que hoje, olhando para trás, acho aquela torcida uma grande besteira. Onde já se viu, torcer para o Brasil perder a Copa.... Era um sentimento ultrapassado, démodé.
Em 1994, fiquei animado com a possibilidade do título mundial. As eliminatórias foram conturbadas. Chamaram Romário que, com sua genialidade, classificou o Brasil. Para incorrer no exagero alheio, arrisco a dizer que nos trouxe a taça também. Era uma seleção bacana, mas, à exceção de Romário e Bebeto, os demais jogadores não eram fantásticos. Ronaldo, aquele que seria posteriormente apelidado de Fenômeno, foi para os Estados Unidos no banco da seleção. Parece que comprou vinte pares de tênis. Não jogou, ficou quieto aprendendo algumas coisas que certamente lhe serviram para experiências futuras.
Ganhamos a Copa da Itália na disputa de Pênaltis, com um erro de Roberto Baggio. Foi uma vitória esquisita. Tive a sensação de que deveríamos ao menos ganhar a partida com um gol nosso e não com erro da seleção adversária.
Os jogadores foram recebidos aqui com honras de Estado e causaram polêmica por não quererem pagar os impostos das volumosas compras feitas na América. Um dos nossos titulares achou justo que não pagassem impostos: a velha prática do patrimonialismo havia tomado a cabeça dos nossos esportistas. Já que venceram a Copa, “fizeram uma festa bonita”, teriam direito à isenção tributária? Podíamos ficar sem essa....
Em 1998 o Brasil certamente ganharia a Copa. Com uma seleção mais competente que a anterior, fomos para as disputas crentes de que não teria para ninguém. O Brasil era o favorito. Fomos à final. Saí no dia anterior para encher a cara de chope. Quando a partida – aquele espetáculo bizarro – começou, cheguei a me perguntar se era realidade ou alguma conseqüência do porre do sábado. Primeiro tempo: dois a zero para a França. Meu pai me ligou no intervalo do jogo. Ainda poderíamos reverter a situação! Mas qual o quê? Tomamos mais um gol e até hoje tentamos entender o que aconteceu com Ronaldinho.
2002 foi a maior zebra da história das Copas das quais participamos, ou seja, de todas. A seleção daquela época havia feito as partidas das eliminatórias sem nenhuma competência, nenhum brilho. Jamais acreditei que pudessem fazer algo em campo. Felipão foi quase agredido por não levar Romário. Brigou com 180 milhões de brasileiros e não arredou pé: Romário não foi.
Fomos campeões. Vi Ronaldinho jogar para valer, obstinado a ganhar a Copa, como disse em várias entrevistas. Era a redenção do menino. Todos duvidaram que ele pudesse, depois das cirurgias do joelho, voltar a jogar como antes. Foi o artilheiro daquela Copa que fez brasileiros acordarem de madrugada para torcer. Ganhamos o título numa manhã de domingo, por volta das dez horas da manhã.
Tal como aconteceu em 1998, fomos para a Copa de 2006 convictos de que iríamos faturar outro título. Vimos uma seleção brasileira apática perder para a França. Ouvi Cafu, com a maior cara-de-pau, retrucar para um jornalista que a sua geração era vencedora e que a derrota para a França não poderia ser parâmetro para avaliá-la. Ainda que tivesse razão, seria melhor ter ficado quieto ou se desculpado pelo vexame de seus colegas. Pela terceira vez, fomos eliminados da Copa pela França.
Agora, a poucos dias da estréia da Copa de 2010, quero crer que a seleção de Dunga possa nos surpreender. Para não arriscar palpite, fico na expectativa. Essa, de todas as seleções que vi jogar, é a mais misteriosa, aquela que menos conheço.
Ainda assim, merece minha torcida.
Além delas, tenho alguma lembrança vaga da Copa de 1978. Eu tinha 6 anos e vivia brincando no pátio do prédio em que morava. Ouvia gritos de gol que, ao menos para mim, nada significavam.
Em 1982, já com dez anos, fui apresentado realmente à Copa. E da melhor maneira possível: em casa comprávamos salgadinhos e refrigerantes para ver os jogos. Ficávamos na sala, obcecados, absortos. Brasil goleava as demais seleções. A escalação daquela seleção é digna de nota: Sócrates, Zico, Junior, Falcão, Éder, Batista, Leandro, Toninho Cerezo e Valdir Peres no gol. Devo ter esquecido de alguém, mas foi a melhor seleção que vi jogar. Até hoje lembro-me de certos detalhes como, por exemplo, o último escanteio batido pelo Brasil após a fatalidade do gol de Paolo Rossi. Estavam ali minhas esperanças de não sermos eliminados.
Não acreditei na desclassificação. Acho que foi naquela Copa que aprendi a indiscutível lição de que o futebol não é justo. É preciso contar com o senso de oportunidade ou com aquilo que alguns chamam de sorte.
Em 1986, perdemos nos pênaltis para a França. Zico errou um pênalti no tempo regulamentar da partida. Disseram-me, depois, que insistiu em bater o tal pênalti porque havia prometido para o filho que, caso houvesse uma penalidade máxima, assim agiria. Foi longo o tempo em que amaldiçoei o moleque. Doutor Sócrates, então meu ídolo maior do futebol, também errou. Bateu um pênalti displicente, sem garra, sem vontade. Aquilo não combinava com ele.
1990, em plena era Collor, tivemos a pior seleção que já vi jogar. Contaminado por pruridos ideológicos, não queria ver o Brasil campeão. Achava que a eventual conquista da taça pudesse chancelar o aparente clima de prosperidade que o então presidente queria fazer vingar a todo custo. Só não gostei de termos sido eliminados pela Argentina. Maradona havia dado alguma entrevista provocativa em que vaticinara nossa eliminação. A partir de então, continuei a torcer para que perdêssemos o mundial, mas, com mais fervor, torci para que não fôssemos desclassificados pela seleção de Diego Armando. Claro que hoje, olhando para trás, acho aquela torcida uma grande besteira. Onde já se viu, torcer para o Brasil perder a Copa.... Era um sentimento ultrapassado, démodé.
Em 1994, fiquei animado com a possibilidade do título mundial. As eliminatórias foram conturbadas. Chamaram Romário que, com sua genialidade, classificou o Brasil. Para incorrer no exagero alheio, arrisco a dizer que nos trouxe a taça também. Era uma seleção bacana, mas, à exceção de Romário e Bebeto, os demais jogadores não eram fantásticos. Ronaldo, aquele que seria posteriormente apelidado de Fenômeno, foi para os Estados Unidos no banco da seleção. Parece que comprou vinte pares de tênis. Não jogou, ficou quieto aprendendo algumas coisas que certamente lhe serviram para experiências futuras.
Ganhamos a Copa da Itália na disputa de Pênaltis, com um erro de Roberto Baggio. Foi uma vitória esquisita. Tive a sensação de que deveríamos ao menos ganhar a partida com um gol nosso e não com erro da seleção adversária.
Os jogadores foram recebidos aqui com honras de Estado e causaram polêmica por não quererem pagar os impostos das volumosas compras feitas na América. Um dos nossos titulares achou justo que não pagassem impostos: a velha prática do patrimonialismo havia tomado a cabeça dos nossos esportistas. Já que venceram a Copa, “fizeram uma festa bonita”, teriam direito à isenção tributária? Podíamos ficar sem essa....
Em 1998 o Brasil certamente ganharia a Copa. Com uma seleção mais competente que a anterior, fomos para as disputas crentes de que não teria para ninguém. O Brasil era o favorito. Fomos à final. Saí no dia anterior para encher a cara de chope. Quando a partida – aquele espetáculo bizarro – começou, cheguei a me perguntar se era realidade ou alguma conseqüência do porre do sábado. Primeiro tempo: dois a zero para a França. Meu pai me ligou no intervalo do jogo. Ainda poderíamos reverter a situação! Mas qual o quê? Tomamos mais um gol e até hoje tentamos entender o que aconteceu com Ronaldinho.
2002 foi a maior zebra da história das Copas das quais participamos, ou seja, de todas. A seleção daquela época havia feito as partidas das eliminatórias sem nenhuma competência, nenhum brilho. Jamais acreditei que pudessem fazer algo em campo. Felipão foi quase agredido por não levar Romário. Brigou com 180 milhões de brasileiros e não arredou pé: Romário não foi.
Fomos campeões. Vi Ronaldinho jogar para valer, obstinado a ganhar a Copa, como disse em várias entrevistas. Era a redenção do menino. Todos duvidaram que ele pudesse, depois das cirurgias do joelho, voltar a jogar como antes. Foi o artilheiro daquela Copa que fez brasileiros acordarem de madrugada para torcer. Ganhamos o título numa manhã de domingo, por volta das dez horas da manhã.
Tal como aconteceu em 1998, fomos para a Copa de 2006 convictos de que iríamos faturar outro título. Vimos uma seleção brasileira apática perder para a França. Ouvi Cafu, com a maior cara-de-pau, retrucar para um jornalista que a sua geração era vencedora e que a derrota para a França não poderia ser parâmetro para avaliá-la. Ainda que tivesse razão, seria melhor ter ficado quieto ou se desculpado pelo vexame de seus colegas. Pela terceira vez, fomos eliminados da Copa pela França.
Agora, a poucos dias da estréia da Copa de 2010, quero crer que a seleção de Dunga possa nos surpreender. Para não arriscar palpite, fico na expectativa. Essa, de todas as seleções que vi jogar, é a mais misteriosa, aquela que menos conheço.
Ainda assim, merece minha torcida.
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