"Modelando o artista ao seu feitio/ O tempo, com seu lápis impreciso/ Põe-lhe rugas ao redor da boca/ Como contrapesos de um sorriso. "Tempo e artista" - Chico Buarque/1993
domingo, 2 de setembro de 2007
Sr. Luiz Inácio e o monopólio da autoridade moral e ética
Quando pensei em criar esse blog jamais imaginei que ele pudesse se prestar a algum tipo de comentário político. Lembro-me sempre de Mário de Andrade e suas reiteradas recusas da política. "Não me fale em política. Tenho horror à política", dizia o autor de Macunaíma. Naturalmente, o leitor da obra marioandradina sabe que essa recusa não significava repúdio à política, mas sim às suas estruturas partidárias e burocráticas. Mário foi um grande combatente político, não restam dúvidas (o interessado no assunto poderá ler Missionários de uma utopia nacional-popular, livro de minha autoria, publicado pela Editora Annablume: www.annablume.com.br).
Pois bem... jurei que não publicaria, aqui, nada de talhe político. Não pude me conter, entretanto.
Ontem, ao discursar no 3o Congresso do PT, o Sr. Luiz Inácio mais uma vez reivindicou para seu partido o monopólio da autoridade moral e ética! As palavras, publicadas na edição de hoje da Folha de S. Paulo, são as seguintes:
"É verdade que podemos ter cometido erros, e os erros estão sendo apurados como precisam ser. Ninguém neste país tem mais autoridade moral e ética do que nosso partido. Admitimos que tem gente igual a nós, mas não admitimos que tenha melhor".
Não é preciso grande esforço de interpretação para inferir que, segundo seu depoimento, o PT tem o monopólio da autoridade moral e ética no Brasil. Além disso, o PT parece traduzir os conceitos da lisura, da transparência e honestidade. Abaixo dele, muitos; acima, ninguém!
Quanta pretensão! É muita arrogância!
O Sr. Luiz Inácio é mesmo um indivíduo muito inteligente! Agora que as luzes do cenário público nacional se voltam para a votação do mensalão no STF, vem ele inverter a lógica do discurso que fizera por ocasião das denúncias de Roberto Jefferson. À época, concedera sagaz entrevista na qual fazia crer o incauto eleitor que já havia se afastado do partido em razão de suas atribuições na Presidência da República. Assim, investido do cargo de Chefe do Executivo, não teria tempo e condições práticas de tomar conhecimento sobre o que realmente se passava no PT. Eventuais negociações escusas, improbidade na condução das finanças do partido e outros tantos assuntos, não lhe eram familiares. Afinal, um presidente da República não teria tempo para acompanhar tanta coisa... Por ironia, a infausta declaração transformou-se, em exíguo espaço de tempo, em motivo de pilhéria nacional.
Curioso notar que, nesse mesmo período, o Sr. Luiz Inácio também reivindicara para si o monopólio da autoridade moral e ética. Para que não pairem dúvidas sobre essa reivindicação, vejamos sua declaração, publicada na Folha on line, em 21/06/2005:
"Ninguém neste país tem mais autoridade moral e ética do que eu para fazer o que precisa ser feito nesse país".
Mas, afinal, o Sr. Luiz Inácio continua petista? A pergunta não é descabida. Em 2005 fazia-nos crer que era apenas presidente e que os quadros partidários, bem com sua rotina, estavam muito distantes de sua realidade. Não era, então, um petista militante! Hoje, ainda presidente, a situação assumiu novas feições. Embora preocupado com a condução da nação, o Sr Luiz Inácio tem tempo de sobra para vociferar no congresso do seu partido a respeito de uma eventual autoridade moral e ética.
Em suma, a ética aí existente não é outra senão a ética da conveniência!
Seja como for, não nos esqueçamos: os baluartes da ética, da moral, da lisura, da transparência e da honestidade são o Sr. Luiz Inácio e o Partido dos Trabalhadores! Ninguém mais é melhor do que eles! Ninguém!
Em tempo: em 1989, 1994, 1998 e 2002 votei no Lula! Em 2006 votei no Sr. Luiz Inácio! Não preciso explicar a diferença. Preciso?
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Um comentário:
Pois o senhor deveria falar mais de política, já que entende do traçado. Evidentemente, a política que conta é aquela que também interessava ao Mário de Andrade... O resto é briga por prebendas...
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