Sempre fui um defensor inconteste da cultura popular. Minhas maiores referências culturais são de extração popular: Chico Buarque e Mário de Andrade. Também sou daqueles que acham que a cultura não tem gradações. Não existe uma cultura melhor do que outra. Tampouco existe cultura mais importante que as demais. Cultura é cultura e, por mais idiota que isso possa parecer, a maioria das pessoas não entende essa simples assertiva. Ok, não vamos falar nos frankfurtianos para não estender o assunto sem necessidade.
A cultura popular, é fato, se assemelha a um quadro composto por um sem-número de matizes. Nela, de maneira bem pragmática, tudo aquilo que não for erudito, poderá ser considerado popular. Por aí se vê a vastidão de manifestações que, sem receio algum, podemos qualificar de populares.
Na música, por exemplo, a cultura popular é capaz de “acolher” desde Chico Buarque a Zeca Pagodinho, de Tom Jobim ao Bonde do Tigrão, de Noel Rosa a Lobão, de Cartola a Zezé de Camargo e Luciano, de Edu Lobo até Beto Barbosa, de Paralamas do Sucesso até a.... Banda Calypso.
Dizer que as culturas são diferentes e que não há, entre elas, nenhum tipo de hierarquia não é o mesmo que deixar de reconhecer que existe, do ponto de vista de sua composição, uma diferença significativa. É indiscutível que a elaboração de algumas obras populares demandem mais esforços de inteligência e talento do que outras.
Exemplificando, não dá para comparar a qualidade literarária de uma letra de música que diz “Ergueu no patamar quatro paredes sólidas, Tijolo com tijolo num desenho mágico, Seus olhos embotados de cimento e lágrima” (Chico Buarque) com outra que diz “Vem, vem, Tchutchuca, Vem aqui pro seu Tigrão, Vou te jogar na cama, E te dá muita pressão!” (Bonde do Tigrão). Em que pese a importância e o necessário respeito à música do Bonde do Tigrão, seus versos muito se distanciam (estou sendo eufêmico) do requinte da produção do Chico.
Diga-se o mesmo de uma melodia qualquer de Tom Jobim e de uma música de Rock ‘n Roll que, em tese, está respaldada numa estrutura de três minguados acordes. Ou, por fim, uma composição de Edu Lobo para teatro e algo da lavra de um Latino.
Seja como for, a cultura popular é como coração de mãe: nele cabem muitos filhos que merecem respeito. Mesmo assim, preconceitos à parte, confesso que às vezes é difícil suportar algumas composições. Recentemente, tive a infelicidade de ouvir um cantor chamado Miguel Teló cantando o seguinte: “Delícia, delícia, Assim você me mata, Ai se eu te pego, ai ai se eu te pego”.
“Ai se eu te pego, ai, ai, se eu te pego”????
Aí, não dá! É de foder!
Um comentário:
Delícia, delícia...esse seu texto!!
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