quinta-feira, 22 de maio de 2008

Adorando Fernanda Young


Andei sumido. É a falta de tempo. Voltei, embora ainda falte o tempo...

O título desse post só poderia resultar no gerúndio... É que, para os desavisados, o título do programa da Fernanda é "Irritando Fernanda Young" (IFY). Até aí, tudo bem. Mas, por que o infame trocadilho? Nem eu sei... Adoro a Fernanda! Isso basta...

Já havia iniciado um post sobre sua sinceridade espontânea quando despertou-me interesse pela leitura de seu último romance: Tudo que você não soube (Rio de Janeiro: Ediouro, 2007). É óbvio que não vou fazer nenhuma resenha do livro. Tampouco vou contar a história, adiantando tal ou qual detalhe do livro.

Pelo título da obra é possível perceber que se trata de uma confissão ou de algumas memórias. A narradora tem um pai moribundo e, por razões que aqui não convém falar, escreve um amargo relato para ele. Pretende terminá-lo antes que o velho morra.

O livro é repleto de referências aos anos oitenta; várias delas bastante conhecidas; outras, nem tanto. Fernanda retira do baú, sempre oscilando entre o ínicio e o fim daquela década, preciosidades curiosas.

Uma delas é Atração Fatal, filme de Adrian Lyne, com Glenn Close e Michael Douglas. É belíssima a digressão feita sobre a personalidade dos personagens... Em um dado momento da narrativa surge aquela imagem que não sai da cabeça daqueles que assistiram ao filme: o coelho branquinho que está na panela com água fervente, os olhos abertos, cozinhando por inteiro. Pois é pautada nessa situação que a narradora cunha a expressão “coelho-na-panela”. Diz ela: "Uma mulher está coelho-na-panela quando ela fica tão ensandecida com uma situação, que passa a ver razão nas piores crueldades" (p. 40).

Fiquei a pensar que a expressão pudesse ser difundida no universo feminino para denotar situações semelhantes àquelas resultantes da TPM. Seria uma variante da TPM em sua forma social. Se a TPM resulta de fatores naturais, a "mulher coelho-na-panela" resultaria dos intrincados labirintos do relacionamento humano. Em suma, não defluiria de causas orgânicas. Não se imagine como seria a "mulher coelho-na-panela" acometida pela TPM...

Voltemos à expressão... O que a deprecia é a serenidade exigida para colocar o tal coelho na panela em circunstâncias de aflição e ira. Talvez por isso ela soe inviável. Todavia, pensemos.

Como poderia a mulher colocar o bicho na panela? Deveria matá-lo, por suposto. O coitado não poderia ser cozido vivo. Isso seria muita sacanagem (que o digam os defensores dos animais!). Pois bem. Então, seria preciso matá-lo. Mas, como fazê-lo? Não importa. Na hora da raiva, a mulher faria isso, sem hesitar. O segundo passo consistiria em arrumar uma panela na qual coubesse o coelho. Haveria que se procurar por uma. E se ela inexistisse? Se houvesse apenas uma canequinha para ferver a água do café? Suponhamos, para prosseguir com a brincadeira, que a mulher encontrasse a panela. Pacientemente, deveria abrir a torneira e esperar que o recipiente ficasse cheio. Colocaria o coitado na panela, ligaria o fogo e pronto: teríamos um coelho na panela.

Falando assim, tudo parece fácil. Imagine-se, entretanto, uma mulher desperada equacionar todos os dados dessa tarefa e executá-la de modo eficaz. Coisas que só acontecem no cinema...

A expressão derivada de uma trama ficcional não precisa de justificativa. O problema seria a falta de praticidade para pronunciá-la. "Mulher coelho-na-panela" é muito extensa... Não se afigura interessante, sobretudo se comparada à TPM, sigla vagabunda de três letras, curta e fácil de pronunciar...

Esqueçamos a expressão, a mulher, o coelho e a panela.

Outras referências daquela década são mencionadas quando a narradora das memórias refere-se ao SBT. Antes de enumerar alguns programas da emissora, diz ela: "agora, que o SBT fodeu com a minha vida, ah, isso fodeu". (p. 55). Sugere que deveria receber "indenização por perdas e danos" e que essa indenização deveria ser duplicada "por ter visto um filme chamado O Homem Cobra". (p. 55).

Embora não fosse minimamente afeito à emissora (e ainda não sou!), cheguei a assistir ao filme, confesso. Eu era moleque e naquela época não havia internet, TV a cabo e outras modernidades mais. As opções de entretenimento eram exíguas. Daí porque, muitas vezes, tínhamos de assistir ao que se nos apresentava... A vida era muito tacanha!

O Homem Cobra é um inequívoco trash dos anos oitenta. A história é patética... Até onde minha memória alcança, trata-se da trajetória de um sujeito que aceita submeter-se, sabe-se lá por qual razão, a alguns experimentos do pai de sua namorada. E tome picada de cobra no banho! Os tais experimentos não dão certo e o rapaz acaba tendo o organismo todo alterado. Parece desenvolver o couro característico das cobras e outras feições do animal. Pouco a pouco, vai apodrecendo, virando um bicho esquisito. Perde os membros inferiores e superiores. Fica verde. Nessas circunstâncias, o que poderia restar a um homem/animal como ele? Virar objeto de exposição em um circo de aberrações da comunidade local.

Numa noite qualquer, a namorada, que havia tempos não se encontrava com ele, entra no tal circo e passa perto da banheira em que o coitado se encontra. A seguir temos a seguinte sequência: ela olha para ele, ele emite alguns grunhidos como a insinuar sua identidade pretérita, ela berra, balança a cabeça, descabela-se, chora e sai correndo. Os incautos telespectadores ficam sem saber se a moça o teria reconhecido ou se apenas ficou aparovada com a aparência daquela criatura. Não sei como o sujeito termina... Nem o filme. Não cheguei a sonhar com ele, mas espero não vê-lo nunca mais...

Se comecei a falar da Fernanda e logo passei ao livro é porque há alguma razão. Embora se diga que geralmente o autor se esconde por trás de seus personagens, gerando um cômodo álibi, acredito que há um pouco de Fernanda Young na narradora daquelas memórias. Há momentos em que o leitor pode supor uma identificação entre a autora e a personagem da trama. A consonância entre as opiniões da Fernanda expressas no programa e verificadas na trama do livro talvez corrobore minha impressão. Quem quiser conferir, deve assistir ao programa e ler o livro. Valerá a pena.

Para terminar, explico a sinceridade espontânea aludida no início desse post. Fernanda Young é a única personalidade midiática capaz de afirmar diante das câmeras que desejaria chamar alguém de vaca no trânsito (entrevista com Caio Blat), é a única capaz de reputar punheteiros os moleques que andam em bando e xingam meninas gordas (entrevista com Cláudia Gimenez), é a única capaz de confessar, em tom de pilhéria, o pavor de vento encanado, herança da criação de seus avós (não lembro quem era o entrevistado). É espontaneamente sincera porque capaz de declarar que a voz de Paulo Miklos é a melhor dentre todas as demais dos Titãs; porque capaz de declarar, sem nenhuma histeria, que invejou Paula Toller quando a moça cantou com o Chico...

A Fernandinha – ela que me perdoe a inconveniente intimidade – é inteligente, bem humorada e simpática. Com ou sem TPM, coelho-na-panela, homem cobra e o escambau, é a salvação dos domingos.



2 comentários:

Antonio Ozaí da Silva disse...

Roberto,

tive interesse e li...

Abraços e ótima semana,

Anônimo disse...

Não curto a Fernanda Young, não sei me passa uma coisa "fake". De todo modo seu texto é sedutor a ponto de colocá-la em minha lista de futuras leituras.
'Grande abraço