Sexta-feira Santa chuvosa. Vontade de não fazer nada, ficar em casa. Ela me liga:
- O que cê tá fazendo?
- O que cê tá fazendo?
- Nada.
- Vamos lá?
Lá. Se ela
falou “lá” é porque supôs que eu soubesse onde era.
- Onde?
- Na casa
dele.
Não tinha a
menor vontade de ir. Queria ficar quieto.
- Muito
empenho! - eu disse.
- Vamos, ela
insistiu.
Não
podia recusar. Sabe aquela sensação? Puta que pariu, você pensa.
- Ok. Em meia hora, na quinze. Pode ser?
- Ok. Em meia hora, na quinze. Pode ser?
- Jura que cê
vai?
Fazer o quê?
Eu ia.
O sujeito era
metaleiro. Gostava de rock pesado. Hard. Aquelas coisas que eu, mesmo curtindo rock ‘n roll, não conseguia suportar.
Além do mais, a conjuntura pessoal não era favorável. Passarim, do Maestro Jobim, havia acabado de sair. Eu ouvia, mentalmente, "I've never been in Paris for the summer, I've never drank a Scotch with
this bouquet, My life is such a mess let'a have a Brahma, I'm happy that you called, I really feel touché”...
- E se ele nos convidar pra entrar?
Nem
respondeu.
Fui.
Com chuva, inércia e, o pior, o ponto de ônibus. Mais de meia hora esperando
ali, o vento gelado, a chuva fina. A incerteza de que o ônibus passaria: nada
pior.
-
Melhor desistir, sugeri.
-
Não brinca comigo.
-
Tem certeza?
-
Lógico. Vai valer a pena.
Valer
a pena? Pra quem, cara pálida? – pensei, mas não falei nada.
O
ônibus chegou.
-
Sabe o endereço?
-
Mais ou menos. Fui lá uma vez.
Chegamos.
Tocou
a campainha e alguma coisa disparou dentro dela. Arritmia, aos 16 anos, é
sintoma de paixão. Não era.
Cinco
minutos. Não dá pra acreditar. O metaleiro viajou. Tivesse, ao menos, avisado. Nem
recado na porta. Claro, ele nem sabia quem era o Arnesto.
-
Vambora? – ela perguntou.
-
Certeza? Não quer tentar mais um pouco? – retruquei irônico.
Voltamos.
De ônibus.
Ao
chegar em casa, coloquei o LP na pick up do meu pai.
Ouvi Chansong: “My life is such a mess...”
Ela poderia contar comigo. Sempre.