Enfim, o que aconteceu com o Carva
Uma Big Band como o Brasil jamais ouviu foi
contratada pelo Gênova. Ao som de Anything Goes, convidados começaram a
chegar. Luzes, brilhos, odores e melodias enformavam a atmosfera de um grande
acontecimento. Homens de Black Tie, mulheres de longo, garçons com
atendimento impecável. Scotch, Single Malts, Bourbons, Pró-secos, tintos
de extração premiada eram sorvidos sem moderação. À socapa, entre móveis e
cortinas, carreiras de coca eram aspiradas pelos adictos. Alguns não perceberam
que o preto do smoking contrastava com o brilho do pó e denunciava os incautos.
Quando Carva chegou no salão, deu um efusivo
abraço no italiano. Naquele instante, Gênova foi atingido pelo olhar de Murilo
e não deixou de piscar para ele. Era a senha confirmando a execução do meu
amigo.
Eu já sabia que Léo havia se encarregado de
relatar ao Gênova todo o estratagema de locupletação do Carva. Derramou sobre a
mesa provas, acionou áudios para sua apreciação e até chamou testemunhas para
corroborar o alegado. Com tudo isso, não restava dúvida sobre as intenções do
italiano.
O difícil foi convencer Carva a dar
seguimento ao que havíamos combinado para mantê-lo vivo. Ele chegou na festa alucinado,
pretendendo fazer um escândalo e dar cabo no próprio Gênova. De quebra, também
mataria o Murilo. Estava ressentido com a traição dos dois e faria o que
pudesse para sugerir que os homicídios eram passionais.
- Porra, Carva! Assim, você vai se foder!
Não sei de que maneira consegui chamá-lo à
razão. Pusemos o plano em prática.
Saímos da festa e fomos para a zona do
meretrício municipal. Lá, ateamos fogo no carro do Carva. Antes disso,
colocamos o cadáver que Minhão nos arrumou no banco do motorista. Sim, Minhão nos
ajudou graças à anuência do Solda, a quem Carva pagou todas as dívidas por drogas,
com juros e correção monetária.
Para facilitar a identificação do corpo do
Carva deixamos seus documentos do lado de fora do veículo. Como sabíamos que o cadáver
passaria por perícia no IML, negociamos com o legista responsável pelo
Instituto de Criminalística um valor significativo para que a identidade do meu
amigo constasse do laudo. Em suma, a ciência atestaria que o corpo carbonizado e
supostamente torturado era do Carva.
Naquela madrugada, deixei meu amigo escondido
em casa. Pela manhã, antes mesmo de a polícia encontrar o cadáver carbonizado,
Carva estava embarcando para a Itália, com identidade falsa.
Encarreguei-me de enviar ao Ministério Público
Federal todas as escutas ambientais e telefônicas que Carva registrou durante
as tratativas com Gênova, o Senador José Décio e o governador. Na sexta-feira
subsequente, todos foram presos preventivamente. Já se sabe que, agora, respondem
pelos vários crimes cometidos.
Juliana não conseguiu mais acessar as
contas do Carva. Ele transferiu o dinheiro para a Itália e deixou as contas suíças
zeradas. Para ela, restou apenas o apartamento em que residiam.
Enfim, hoje, Carva atende pelo nome de Guilhemo
Di Tulio e passa os dias longe de confusões em Altomonte, um belo vilarejo no
sul da Calábria.